terça-feira, 26 de junho de 2012

A música que nasce de uma ideia exterior





A Sinfonia Fantástica Opus 14, nome oficial Episódio da Vida de um Artista, Sinfonia Fantástica em Cinco Partes (em francês Épisode de la vie d’un artiste, symphonie fantastique en cinq parties), foi a primeira sinfonia do grande compositor e músico Hector Berlioz , composta no ano de 1830. É o verdadeiro nome da obra, apresentada no dia 5 dezembro de 1830 no Conservatório de Paris, sob a batuta do maestro François-Antoine Habeneck. Esta apresentação difere da que conhecemos hoje, uma vez que Berlioz revisou o trabalho durante anos e só veio a republicá-la em 1845.

 
É o trabalho mais conhecido de Berlioz e foi criado por inspiração de sua paixão pela atriz irlandesa Harriet Smithson, após vê-la representar o papel de Ofélia na peça Hamlet, de Shakespeare, no Teatro de Paris, em 1827, e também pela leitura de Fausto, de Johann Wolfgang von Goethe. A obra é um marco na música francesa, pois inaugura o sinfonismo na França. Berlioz quebra a estrutura formal da sinfonia, formada de quatro movimentos, quando a apresenta com um movimento a mais. Berlioz redigiu um roteiro impresso em 1831 em que indicava o que o protagonista imaginava em cada movimento da obra. Para o autor, o artista, sob efeito do ópio, tem alucinações e estas são traduzidas em cinco situações indicadas através dos cinco movimentos.

 

 

 
A 11 de Setembro de 1827, em Paris, Hector Berlioz assistiu a uma representação teatral de William Shakespeare, uma das obras mais admiradas do que era o seu autor predileto. No papel da desventurada Ofélia atuava uma atriz irlandesa, Harriet Smithson, pela qual o músico se apaixonou perdidamente, ao ponto de conquistá-la, apesar de ele não falar nem uma palavra de Inglês, e ela o mesmo de francês, se ter transformado numa verdadeira obsessão. Fruto desse amor levado ao limite seria a Sinfonia Fantástica. A sua estreia a 5 de Dezembro de 1830 iria constituir uma das páginas mais recordadas da história da música ocidental. Havia apenas três anos que morrera, em Viena, o grande Ludwig van Beethoven, quando se estreou esta obra revolucionária. Levava o género sinfónico numa direção insólita, sobretudo no que respeita a uma orquestra que se converte na verdadeira protagonista, na intérprete de um drama que o compositor explicita claramente num programa literário, uma vez que não é em vão que a partitura ostenta o subtítulo “Episódios da vida de uma artista”; uma artista que sem dúvida alguma era o próprio criador. Como se dizia num programa que era distribuído à porta do Conservatório de Paris, no dia da estreia: “O objetivo do compositor foi desenvolver os aspetos musicais de diferentes situações da vida de um artista. O esquema do drama instrumental, privado da ajuda de palavras, precisa de uma exposição preliminar. O seguinte programa deve, pois, ser considerado um diálogo falante de uma obra, e serve para introduzir os números musicais e para motivar o seu caráter e expressão”. Este programa é muito simples: “um jovem músico, de uma sensibilidade doentia, envenena-se com ópio num arrebatamento de desespero amoroso. A dose da droga, demasiado pequena para o matar, mergulha-o num profundo sono acompanhado de estranhos desvaneios, em que as sensações, sentimentos e recordações se transformam, no seu cérebro doente, em imagens e ideias musicais. A própria amada aparece-lhe como uma melodia, como uma ideia fixa, uma ideia obsessiva, que ouve onde quer que vá.” A partir daí, acontece tudo o que em seguida se ouvirá.

 
O primeiro andamento intitula-se Sonhos e Paixões - ao longo dele, narram-se, sempre segundo as palavras do seu criador, “a doença da alma, o fluxo da paixão, as inenarráveis alegrias e penas que experimentaram antes de ter visto a sua amada; depois, o amor vulcânico que de repente lhe inspira, os seus êxtases delirantes, a sua fúria ciumenta, a sua persistente ternura, as suas consolações religiosas.”

 
O segundo andamento, intitulado Um Baile – “O artista, levado pelas circunstâncias mais diversas da vida, vê-se no meio do tumulto de uma festa. Mas até mesmo ali, a imagem querida vem apresentar-lhe e perturbar a sua alma.”

 
O terceiro andamento, A Cena no Campo – um maravilhoso adagio que mostra a dívida de Berlioz para com a Sinfonia “Pastoral”, de Beethoven. “Numa tarde de Verão, no campo, o artista ouve dois pastores que dialogam cantando. Este dueto pastoral, o local de cena, o ligeiro murmúrio das árvores agitadas pelo vento, um motivo de esperança que desde há pouco começou a conceber, tudo concorre para restaurar no seu coração uma calma inusitada, para dar um tom mais alegre às suas ideias; mas ela aparece de novo e o jovem sente outra vez uma forte opressão no peito; agitam-no dolorosos pressentimentos; se ela o enganasse… um dos pastores repete a ingénua melodia, mas o outro já não responde. O sol põe-se. Ao longe, ruídos dos trovões, solidão, silêncio…”

 
O quarto andamento, Marcha para o Suplício – um allegretto demoníaco que se desenvolve num implacável crescendo que constitui um perfeito catálogo das habilidades orquestrais e teatrais de Berlioz: afeitos de boca nas trompas, contrabaixos divididos, duplo par de timbales; tudo isso contribui para criar um clima de pesadelo, de horror e de loucura que culmina no aparecimento, no clarinete, da “ideia fixa”, antes de um brutal acorde de toda a orquestra, seguido do rufar da caixa e dos timbales, conceda passagem à pancada com que a guilhotina ceifa a vida do artista; mas este não morreu, no seu delírio “imagina-se agora num sabbat, no meio de uma horrível reunião de sombras, bruxas e monstros, reunidos para celebrar o seu funeral. Ruídos estranhos, gemidos, risadas, gritos distantes a que outros gritos parecem responder. A melodia amada reaparece de novo, mas perdeu o seu carater de nobreza e timidez; não é mais do que o motivo de dança ignóbil, vulgar e grotesco. É ela que vem também ao sabbat. A amada junta-se à orgia diabólica. Badaladas fúnebres, paródia burlesca do Dies irae…”

 
O quinto andamento com que termina a sinfonia – Sonho de uma Noite de Sabbat – contém o melhor e o pior do estilo do músico francês. A introdução a este andamento, por exemplo, é um quadro sonoro extraordinário (o próprio Berlioz dizia que “a instrumentação, na música, equivale exatamente às cores na pintura”). Três toques de sino preparam a entrada do tema do Dies irae, extraído da missa gregoriana de defuntos, a cargo das tubas e dos fagotes e depois dos trombones e trompas, sobre as notas arrastadas e ásperas dos contrabaixos. Segue-se a dança do sabbat, pura confusão sonora, em que Berlioz acumula audazes combinações harmónicas, inusitadas relações rítmicas, inauditas formas de tratar os instrumentos (por exemplo, o col legno das cordas, que têm de ser percutidas com a madeira dos arcos). Tudo isto até terminar numa coda que conduz a música ao paroxismo.


Flávia Oliveira - a63604

 

 

 

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